Mas antes:
TÔ DE FÉRIAS, PORRA \o/
Agora que já tirei isso do meu sistema, vamos começar.
A Ficção científica é um gênero que surgiu no século XIX e que lida, em particular, com as aplicações e os impactos da ciência, real ou fictícia. Porém, a ficção científica não é tão simples de ser definida e também funciona como analogia para vários fins, em particular o funcionamento da sociedade e a própria condição humana.
Para que um trabalho seja considerado de ficção científica, deve-se haver um certo grau de ciência aplicada ou de ciência especulativa. Portanto, é normal que obras de ficção científica se passem no futuro ou no espaço, possuam tecnologias que estão sendo apenas recentemente desenvolvidas (inteligência artificial, teletransporte, railguns, etcetera) ou que a ciência atual considera impossível (viagem no tempo, viagem através de buracos de minhoca, naves mais rápidas que a luz, etcetera). É claro, o livro ainda é uma obra de ficção, portanto nem tudo tem que condizer com a ciência. Porém, a maioria dos temas usados será apresentado com uma condição plausível ou que pelo menos soe plausível para os leitores. Daí que surge a diferenciação entre "Hard Sci-fi", que é extremamente fiel a leis científicas estabelecidas, e "Soft Sci-fi", que toma mais liberdades.
Descrever a ficção científica é uma coisa complexa. O autor Robert A. Heinlein (escritor de "Starship Troopers") disse: "Uma boa e rápida definição para quase todos os tipos de ficção científica é: Especulação realista sobre possíveis eventos futuros, baseado apenas no conhecimento adequado do mundo real, passado ou presente, e com um entendimento pleno da natureza e do significado do método científico." Já Rod Serling, idealizador da série de TV "Além da Imaginação", disse: "A Fantasia é o Impossível que vira Provável. A Ficção Científica é o Improvável que vira Possível."
A Ficção Científica, assim como as outras chamadas "Ficções Especulativas" (como Fantasia, Terror e História Alternativa), sofre preconceito dos auto-proclamados "Escritores sérios". Isso se deve a várias coisas, mas em especial duas:
- Paradoxalmente, a Ficção Científica é considerada complexa demais para o leitor comum, porém simples demais para os aclamados críticos literários.
- Já há um estigma contra a Ficção Científica que surgiu com as histórias publicadas nas Pulp Magazines e nos quadrinhos de heróis como Flash Gordon e Buck Rogers, que marcaram a Ficção Científica como uma coisa boba e infantil na mente da população geral.
Mas claro, Margaret Atwood não escreve ficção científica, porque, em suas palavras, "Ficção Científica tem marcianos e viagens para outros planetas e coisas do tipo." Sobre Margaret, Peter Watts, autor também canadense (seus livros ajudaram a inspirar Bioshock!), diz: "Aí está uma mulher com tanto medo de 'piolhos de ficção científica' que ela irá alegremente redefinir o gênero apenas para se excluir dele."
Atwood diz que seus livros são "baseados em ciência rigorosamente pesquisada, extrapolando tecnologias reais e tendências sociais no futuro", o que é meio que mais ou menos exatamente a definição de ficção científica. Mas ela reforça seu argumento anterior: "Ficção científica tem elementos químicos e foguetes e coisas do tipo".
Imagino que elementos químicos e foguetes não sejam tecnologias reais, certo?
O assunto está bom, mas o post não é sobre o preconceito contra as ficções especulativas: Isso sozinho já daria um artigo inteiro. Vamos falar das origens do gênero.
Vários textos antigos podem ser considerados como precursores da ficção científica, o mais antigo sendo do século II, escrito por um autor Sírio chamado Luciano, intitulado de "Uma História Real" (o livro todo é uma sátira aos cientistas da época, que explicavam fenômenos diversos com deuses e espíritos). Nele, os protagonistas saem de barco, vão parar na Lua, conhecem seres alienígenas e se envolvem numa guerra interplanetária. Eles também ficam presos numa baleia de 300 metros e acabam parando numa ilha de queijo. Você tinha que estar lá pra ver.
Outros contos famosos que podem ser considerados precursores da ficção científica atual são "As 1001 noites", do século VIII e "Taketori Monogatari" (A História do Cortador de Bambu), um conto japonês que fala de um cortador de bambu que encontra uma criança dentro de um broto de bambu. A garota cresce em uma bela moça que conquista o coração de várias pessoas importantes, inclusive o imperador do Japão, mas resiste aos pedidos por um motivo: Ela é uma princesa da Lua e precisa voltar para seu povo. Assim, ela é levada para a Capital da Lua em uma carruagem voadora.
Alguns estudiosos argumentam que o primeiro livro de ficção científica foi "As Viagens de Guliver", escrito em meados de 1726, pelo irlandês Jonathan Swift. O livro é cheio de sátiras à sociedade inglesa da época e também possui certos conceitos científicos que ainda não tinham sido explorados na época, como os ataques aéreos que os Laputianos faziam em cidades rivais.
Já outros estudiosos dizem que o primeiro livro do gênero foi "Frankenstein", escrito em 1818 pela inglesa Mary Shelley (na época ela tinha 18 anos). Esse livro é mais fácil de definir como ficção científica do que As Viagens de Gulliver, já que há críticas à sociedade (a industrialização e a busca do homem de controlar a natureza) e influência científica (o livro faz menção ao processo de Galvanização, que é o estudo da eletricidade aplicada aos músculos animais).
Então, no século XIX, com o advento de novas tecnologias como a eletricidade e o rádio, o gênero ganha relevância. Surgem dois escritores famosos: Júlio Verne e H. G. Wells. Em seu livro "A Guerra dos Mundos", H. G. Wells dá um dos primeiros relatos de uma invasão alienígena.
Devido à popularização do gênero, o século XX conta com vários e vários escritores notáveis, em particular Isaac Asimov (escritor de "Eu, Robô" e "O Homem Bicentenário"), Arthur C. Clarke ("2001: Uma Odisséia no Espaço" e "Encontro com Rama") e Frank Herbert ("Duna").
Porém, não pense que a Ficção Científica só existe na Europa e na América do Norte: A Ficção Científica tem alguns representantes fortes aqui mesmo, no Brasil. Alguns autores famosos que escreveram contos que podem ser considerados de Ficção Científica (ou pré-ficção científica) incluem Machado de Assis ("O Alienista" é considerado como sendo um precursor da Ficção Científica) e Monteiro Lobato ("O Sítio do Pica-pau Amarelo" tem elementos de Ficção Científica, além de seu romance adulto, "O Choque das Raças, ou O Presidente Negro" que é considerado Ficção Científica pura).
Em 1964, Jerônymo Monteiro, considerado o primeiro escritor brasileiro a se especializar em ficção científica, fundou a Sociedade de Ficção Científica. Ele também traduziu histórias em quadrinhos do Walt Disney e inventou, entre outros, o nome "Tio Patinhas", mas isso não vem ao caso.
Foram nas décadas de 60 e 70 que a Ficção Científica fez mais sucesso no Brasil. A partir de "Eles herdarão a Terra", da escritora Diná Silveira de Queirós (segunda mulher a entrar na Academia Brasileira de Letras), vários escritores surgiram e começaram a se organizar. Foi nessa época que saíram as primeiras publicações de André Carneiro, considerado um dos maiores gênios da ficção científica brasileira.
Vários autores de ficção científica surgiram e ainda surgem no Brasil. Porém, nem por isso é um gênero fácil de se publicar. Sem falar do preconceito que já discutimos acima, ainda há desinteresse geral pela população do Brasil. Revistas de contos de ficção científica, como a finada Sci-fi Contos, são uma das maneiras mais fáceis de fazer um nome e quem sabe conseguir uma publicação grande, mas essas costumam ser fracasso de venda e são descontinuadas após algumas publicações mensais.
E, basicamente, é isso. Já falei o que tinha que falar e esse post acabou ficando comprido demais. Mas tudo bem, não é como se ninguém fosse ler essa parede de texto mesmo.
Sem mais,
Xau e bença.
1 tijoladas:
Belo post, muito bem escrito. Se eu li uma parede de texto inteira é porque vale a pena =P
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